Digite pelo menos 3 caracteres para uma busca eficiente.

Evento em Passo Fundo (RS) reuniu cerca de 300 pesquisadores, profissionais do agronegócio, agricultores, produtores de sementes, cerealistas e moinhos de 10 estados brasileiros

O salto na produtividade do trigo em diferentes regiões do país está atrelado à pesquisa de tecnologias adequadas às necessidades específicas de cada região produtora, sempre buscando que a qualidade do produto atenda de toda a cadeia do trigo, desde o produtor, cerealistas, moinhos e o consumidor final. E para viabilizar o cultivo que sofre redução de áreas em detrimento ao mercado e do clima em certos estados do país, a cadeia tem se organizado para estabelecer, ainda antes do plantio, parcerias mais firmes entre a indústria e o produtor. Esses e outros assuntos foram debatidos durante o Fórum Nacional do Trigo, em Passo Fundo (RS). A programação é paralela à 13ª Reunião da Comissão Brasileira de Pesquisa de Trigo e Triticale (RCBPTT), realizada nos dias 3 e 4 de julho. Ambos eventos são promovidos pela Biotrigo Genética, com apoio da Embrapa Trigo.

Pesquisa aponta lucro de mais de R$ 200 por hectare

Um estudo realizado pela Fundação ABC em lavouras de trigo do Paraná e São Paulo apontou que a cultura trouxe lucratividade aos produtores que cultivaram consecutivamente o cereal no inverno. Segundo o pesquisador do setor de Economia Rural da Fundação ABC, Cláudio Kapp Júnior, responsável pela pesquisa que analisou o banco de dados coletados pelas cooperativas Capal, Frísia e Castrolanda, há 24 safras deu-se início ao controle dos níveis de produtividade dos produtores e dos níveis de custo de produção, juntamente com a Fundação ABC. “Com base nestes dados, realizamos uma análise para entender qual o resultado do trigo e percebemos que ocorreram safras em que o produtor perdeu dinheiro e outras em que ele ganhou, mas as safras em que ganhou dinheiro superaram as safras negativas. O estudo comprova uma rentabilidade acima de R$ 200 por hectare, mostrando o trigo como boa opção de inverno”.

Cláudio diz ainda que são casos reais registrados no PR e SP de produtores que, independente do mercado ou do clima, sempre cultivaram o trigo. Também frisa a importância de ser implantada uma metodologia que diferencie o fluxo de caixa e a gestão, para compreender que a cultura pode ser boa opção financeira para a safra de inverno.

Perspectivas do Trigo: passado, presente e futuro

O engenheiro agrônomo, PhD em melhoramento genético e diretor da Biotrigo Genética, Ottoni Rosa Filho, abordou as novas tecnologias para o trigo na abertura do painel "Perspectivas do Trigo: passado, presente e futuro". Segundo ele, novas tecnologias são comuns em milho e soja. Para trigo, o tema é visto de forma bastante diferente. Ele detalhou algumas tecnologias que estão mais próximas do triticultor, sob uma perspectiva global. “Estas tecnologias -  HB4, Clearfield e Heathsense - têm em comum terem dois componentes: propriedade intelectual e agregação de valor. No caso do trigo, o valor agregado pode ser para o agricultor ou o consumidor final do trigo”, disse.

O engenheiro agrônomo e consultor Sérgio Schneider, apresentou o cenário do trigo no Rio Grande do Sul e Santa Catarina. Segundo ele, o trigo sempre foi uma cultura importante na região, fazendo parte do binômio trigo/soja. Hoje na grande maioria das regiões tritícolas do RS são cultivados menos de 20% da área útil para a cultura, em função da instabilidade climática e da falta de políticas de preços e garantias de comercialização. Entretanto, com relação a área cultivada ele enfatiza que ela já foi maior no passado, por outro lado, o crescimento da produtividade deu um salto. “Por vários anos tínhamos a famosa receita dos 25 sc/ha, sendo que hoje, bons produtores têm superado os 80 sc/ha com facilidade”, comentou.

Na região, conforme Schneider, pesquisas demonstraram altos potenciais de produção. “Exemplos de campo com bons produtores têm superado as 5 ton/ha, mostrando que a cultura tem potencial. Nas últimas décadas a evolução na triticultura tem se dado na pesquisa em busca de materiais genéticos mais produtivos e adequados ao mercado, bem como na evolução dos processos produtivos para altas produções e a assistência técnica levando as tecnologias junto aos produtores”, disse. Por outro lado, Schneider comentou que o que muitas vezes acaba impedindo os produtores de obterem os altos rendimentos é a instabilidade climática. “O excesso de chuva é o fator que mais interfere negativamente na cultura, ocasionando doenças de espiga por ocasião do florescimento ou no momento da colheita e, assim depreciando a qualidade do produto final ou até inviabilizando para panificação”, analisou.

O diretor da Lagoa Bonita Sementes, Auleeber Santos, apresentou o cenário da cultura em São Paulo. O cultivo do trigo no Estado é recente, se dando a partir dos anos 2000. Desde então, ele ressalta a evolução significativa na área cultivada em função da pesquisa, buscando cultivares adaptadas e também propiciando uma produtividade mais elevada. “Grande parte do nosso produto final tem como destino mercados em São Paulo, o que viabiliza nossa logística e negociação. Por conta disso, o cenário é favorável”, diz acrescentando que o trigo é uma opção de cultivo que auxilia na diluição de custos e fluxo de caixa em um período em que os produtores tem limitadas ações de cultivo. Ele defendeu que o trigo é fundamental na região e que sem ele, o negócio ficaria inviável. “Ajuda a distribuir os custos e ainda traz uma renda em um período (inverno) não teríamos receita. Temos que começar a tratar o trigo como ele merece e não como uma ovelha negra. Porque hoje o produtor coloca 50% do custo no trigo, mas os benefícios proporcionados pelo cereal não são levados em conta.  A produtividade de 17% a mais que a soja produz na área que anteriormente foi ocupada pelo cereal, não é colocada na conta pelo agricultor”, finalizou.

Os experimentos com a cultura do trigo na região do Cerrado tiveram início na década de 70, mas começaram a ganhar força a partir dos anos 2010/2011 e, assim como ocorreu em outras regiões do país, foi em 2016 que os produtores do Cerrado obtiveram a maior produção. Atualmente, a cultura ocupa cerca de 150 mil hectares nos estados de Minas Gerais, Goiás, Bahia e Distrito Federal.

O surgimento de variedades adaptadas às condições do Cerrado e com tolerância à Brusone foram os principais avanços nas últimas décadas, destacou o presidente da Associação dos Triticultores do Estado de Minas Gerais (Atriemg), Eduardo Elias Abrahim. Na região, o aumento da produção na região proporcionou um impacto muito grande na competitividade dos moinhos instalados, com crescimento da moagem e, a consequente oferta de empregos em toda cadeia tritícola. Para Abrahim, a expectativa é de aumento expressivo de área nos próximos anos, bem como a expansão da cultura no país, em função da qualidade do produto e pela quase ausência de micotoxinas. Ele destaca que entre as vantagens da produção está a rotação de culturas, redução de doenças, melhoria do perfil do solo, entre outros.

O engenheiro agrônomo Lucas Simas, chefe de Departamento da Fazenda Experimental da Coamo (Coamo Agroindustrial Cooperativa), destacou o cenário do cereal no Paraná e Mato Grosso do Sul e ressaltou que o potencial produtivo do trigo não depende apenas das condições climáticas, mas também da tecnologia empregada na cultura. Segundo ele, safras avaliadas comprovam a possibilidade do produtor atingir esses índices elevados. “A melhor safra foi em 2016, quando as condições climáticas foram favoráveis, já no ano seguinte o clima não foi tão benéfico, logo, a tendência é da produtividade diminuir. Porém, se olharmos o potencial produtivo do trigo no passar dos anos, é surpreendente a sua evolução”.

Simas exemplifica o potencial da cultura. “Em 2016, safra em que a cooperativa tem como referência de potencial, 18% dos cooperados obtiveram produtividade superior a 65 sc/ha e 6% atingiram produtividade superior a 74 sc/ha. “Isso mostra que o potencial evoluiu bastante e compete a nós e aos produtores buscar potenciais produtivos dessa magnitude”, destaca.

Com relação a rentabilidade comparando com outros cereais de inverno, o trigo torna-se viável com o passar dos anos, pois o cultivo do cereal está atrelado a fertilização. Ele explica que a distribuição de fertilizantes é muito maior e mais efetiva em lavouras de trigo, pelo fato de ser cultivado com espaçamento reduzido de 17 cm entre uma linha e outra, sendo muito positivo quando comparado com o espaçamento a soja que é entre 45 a 50 cm e do milho, entre 50 a 60 cm. Além disso, o volume de cobertura de solo que o plantio do trigo proporciona é muito superior do que o milho segunda safra plantado neste período na região. Sem contar que o trigo é uma cultura que pode ser trabalhada sem aplicação do glifosato. “Com uma cobertura do solo mais eficiente, temos menor incidência de plantas daninhas e um custo menor de dessecação para a cultura principal que é a soja. Comparando com o milho segunda safra, a dessecação com o trigo custa cerca de 10 vezes menos”, comentou.

Para viabilizar e estimular a produção do cereal, a cooperativa criou em 2018 um contrato de planejamento da cultura. Pois no momento de formação da lavoura o preço é um e na colheita é outro, geralmente inferior. Desta forma, com a política de compra com os cooperados eles tem um incentivo e garantia a mais para produzir o cereal.

Legislação torna mais rígidos limites da micotoxina no trigo

O Sul do Brasil concentra 90% da produção nacional de trigo e nessa região a principal doença é a Giberela, causada por espécies do fungoFusarium graminearum, que ocorre especialmente em anos com frequentes períodos de chuva durante o estádio de florescimento. Ao colonizar os grãos de trigo esse fungo produz, principalmente, a micotoxina desoxinivalenol (DON), que representa risco para a saúde das pessoas e dos animais, sendo objeto de legislação específica para limites máximos de tolerância nos alimentos. O manejo da Giberela do trigo no campo, foi abordado pelo fitopatologista da Biotrigo Genética, Paulo Kuhnem. Pela nova legislação de limites máximos toleráveis de DON nos grãos e farinhas terem ficado mais rígidos a partir de janeiro de 2019 ele enfatizou que o manejo para a adequação destes níveis de DON começa no campo pela utilização de cultivares com maior nível de resistência genética associado a aplicação de fungicidas. “Por não se dispor ainda de cultivares imunes é muito importante que os produtores e assistência técnica estejam monitorando o desenvolvimento da cultura e as condições climáticas para realizar aplicações de fungicidas no florescimento e reduzir os teores de micotoxinas nos grãos colhidos”, disse.

A pesquisadora da Embrapa Trigo, Casiane Salete Tibola abordou as estratégicas para minimizar a contaminação do trigo por micotoxinas. Ela destacou a importância de medidas pós-colheita para minimizar a contaminação do trigo e derivados por micotoxinas, visando contribuir para a produção de alimentos seguros e garantir liquidez no mercado.

A especialista em engenharia de alimentos e supervisora de qualidade industrial da Biotrigo, Kênia Meneguzzi, tratou sobre as possibilidades de redução de DON na pré-moagem e abordou uma visão geral do problema. Segundo Kênia, a nova legislação que entrou em vigor em 1º de janeiro deste ano, baixou para 750ppb o limite de DON para farinha de trigo. Ela destacou que os elos da cadeia devem utilizar todas as ferramentas que dispõem para atingir esses novos limites e ter uma melhor comercialização dos lotes.  “O produtor possui opções de cultivares mais resistentes à Giberela e ainda tem como ferramenta realizar manejo indicado, pois não pode contar com o clima, por não poder controlá-lo. Os cerealistas podem ser eficientes no recebimento através da pré-limpeza, mesa de gravidade e também com o cuidado o armazenamento dos grãos. Já os moinhos possuem equipamentos mais específicos, como a selecionadora ótica, que através de infra-vermelho detecta e descarta os grãos contaminados e as impurezas, além do peeling - equipamento que remove a camada mais externa do grão aonde se concentrados os maiores níveis de bactérias, micotoxinas e agrotóxicos”, destacou.

Pesquisa identifica novo vírus do Mosaico

O pesquisador da Embrapa Trigo, Douglas Lau, palestrou sobre as principais viroses que impactam na produção de trigo no Brasil e destacou a mais recente pesquisa multi-institucional realizada com o Mosaico do trigo que apontou a descoberta de um novo vírus chamado WhSMV (Wheat stripe mosaic virus). Esta doença, também presente em vários lugares do mundo, provoca prejuízos de nada menos de 50% da produtividade da lavoura do cereal de inverno. “Até há pouco tempo, acreditava-se que o Mosaico do trigo era provocado somente por dois vírus: SBWMV (Soil-borne wheat mosaic virus) e WSSMV (Wheat spindle streak virus). Por isso a descoberta foi tão importante: identificar que há mais agentes causadores da doença reforça a importância do direcionamento da pesquisa em busca de novas tecnologias, de cultivares resistentes, além de alternativas químicas e culturais para o manejo”, explicou.

Comissão Brasileira de Pesquisa de Trigo 

O Fórum Nacional do Trigo e a RCBPTT são eventos promovidos anualmente pela Comissão Brasileira de Pesquisa de Trigo e Triticale para estabelecer estratégias de cultivo para o trigo e triticale em todo o Brasil. A entidade é formada por instituições de pesquisa e de apoio comprometidas com a produção de ações de pesquisa, difusão de tecnologia e desenvolvimento da cadeia de trigo e triticale. Nesta edição, a promoção dos eventos ficou a cargo da Biotrigo Genética, com apoio da Embrapa Trigo, ambas de Passo Fundo (RS), além dos patrocínios das empresas Basf, Syngenta, Bayer, Coamo, Granotec, Agrária, Apasem e FMC.

Homenagens

Ainda na tarde desta terça-feira, a Comissão Brasileira de Pesquisa de Trigo e Triticale realizou homenagens a dois pesquisadores por suas contribuições à pesquisa e ao desenvolvimento da cultura do trigo no Brasil. A doutora em genética e evolução e com pós-doutorado em citogenética e melhoramento, Maria Irene Baggio, e o agrônomo, pesquisador e mestre em agronomia na área de entomologia, Dirceu Gassen (in memorian) foram representados pelos filhos, Marcelo Caio de Moraes Fernandes e Tais Gassen, respectivamente na cerimônia. Para finalizar a programação do Fórum, os participantes participaram de um coquetel, promovido na nova sede da Biotrigo Genética, patrocinado pela Syngenta. O coquetel aconteceu no centro de pesquisa da Biotrigo.

Daniela Wiethölter Lopes/Asimp/13ª RCBPTT - Biotrigo Genética

#JornalUnião

Clique nas fotos para ampliar

Utilizamos cookies e coletamos dados de navegação para fornecer uma melhor experiência para nossos usuários. Para saber mais os dados que coletamos, consulte nossa política de privacidade. Ao continuar navegando no site, você concorda integralmente com os termos desta política.