As mortes por fenômenos climáticos
Vejo no jornal que 84 pessoas já morreram na região metropolitana de Recife (PE) em decorrência das chuvas que lá ocorrem desde a última quarta-feira. Catorze cidades daquele estado decretaram calamidade pública (que permite aos prefeitos comprar sem concorrência). Tudo isso numa região que, até culturalmente, o Brasil e o mundo sabem sofrer com a seca, segundo especialistas, resultante da forma inadequada de desenvolvimento ali implantada, sem cuidados com a conservação da pouca água, nem ações para evitar a degradação dos rio, que chegam até a secar completamente nas estiagens prolongadas. Hoje é Pernambuco, mas temos de concordar que a má conservação do solo e, principalmente, o manejo inadequado na fase primária do desenvolvimento, é o responsável por grandes prejuízos, sofrimento da população e, principalmente mortes, todos os anos e em todo o país. O homem não soube encontrar-se respeitosamente com a Natureza e hoje, ele próprio ou seus descendentes, pagam elevado preço pelo desencontro.
Esse é um fenômeno mundial. Em toda parte, o homem foi o grande algoz do bioma. Começou tirando água do rio para beber e depois para trabalhar, mas não se preocupou com o lançamento dos dejetos no mesmo lugar de onde bebia o precioso líquido. Demorou décadas, mas a saturação veio e todo o patrimônio construído na insustentabilidade ficou sob risco; chegando a perecer em regiões onde o socorro adequado não veio em tempo. Os grandes rios do mundo – Mississipi, Tenessee (EUA), Sena (França), Reno (Europa, de sul a norte) já sofreram a devastação humana em diferentes nív eis e formatos, mas receberam o devido socorro de governos e da própria comunidade, estando hoje integrados e produtivos nas mais diversas utilidades e aplicações.
No Brasil ainda temos muito a fazer. Apesar da grande tentativa do Planasa (Plano Nacional de Saneamento), do começo dos anos 70, continuamos com muitos problemas. Exemplos são o Tietê, na região metropolitana paulista – um esgoto a céu aberto apesar de campanhas e todo o investimento (notadamente no governo Fleury) que nele se fez por pelo menos nas últimas quatro décadas – e o Pinheiro que, depois de praticamente morto, hoje ressurge através dos esforços e altos custos para torná-lo um parque para os paulistanos. Poderíamos citar dezenas, centenas, talvez milhares de cursos d’água maltratados Brasil afora, mas é desnecessário porque todos os brasileiros conhecem pelo menos um ou dois casos mais p róximos de onde vivem.
Falta atitude integrada. Os rios não deixam de ser poluídos porque, além das obras de tratamento de esgotos das cidades serem atrasadas ou inacabadas, há a ocupação irregular das suas bacias de drenagem que, por ser clandestina, não obedece qualquer tipo de postura de instalação, a começar pelo lançamento dos despejos “in natura” no curso d’água mais próximo. E as autoridades pouco fazem porque muitas delas estão mais interessadas nos votos dos ocupantes do que na sanidade ambiental e até na própria vida dos moradores. Outro problema é a ocupação de encostas e áreas de risco, proibida mas n&atil de;o fiscalizada e muito menos resolvida conforme determinam a técnica e a legislação. O resultado é a profusão de mortes sempre que ocorre um fenômeno climático mais potente, para o qual todos deveriam estar preparado, já que acontece sazonalmente. E conhecimento não nos falta. Tanto que os serviços especializados anunciam com antecedência a aproximação dos fenômenos e, mesmo assim, a tragédia se repete.
O desleixo com as águas e o ambiente é tão grande que, seguramente, todo indivíduo conhece áreas alagáveis no seu caminho ou próximas onde vive. Nas cidades, especialmente nas grandes, temos pontos já sinalizados com a possibilidade do fenômeno. A sinalização deveria ser algo temporário, até a solução da causa, mas permanece por décadas, pois depois que a água baixa, não se fala mais nisso., Com raríssimas e honrosas exceções, os que dizem “lutar” pelo ambiente e ecologia nada produzem, a não ser votos para se eleger e ir ao parlamento de diferentes níveis defender suas teses e int eresses do seu grupo. O povo, mesmo, inclusive aqueles que correm o risco da montanha cair sobre suas cabeças, os vêem apenas de quatro em quatro anos, quando retornam para pedir votos. Ação, mesmo, nada. E quando existem, são destinadas a carrear recursos para os esquemas que, à custa de proselitismo, os sustentam nos gabinetes refrigerados das capitais. É preciso atuar (de verdade)...
Tenente Dirceu Cardoso Gonçalves - dirigente da ASPOMIL (Associação de Assist. Social dos Policiais Militares de São Paulo) - aspomilpm@terra.com.br
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