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Existe uma constante tentativa de explicar a orientação homossexual. Psicólogos, psiquiatras, religiosos, médicos, há muito divergem em suas conclusões profissionais. Em concordância com o pensamento da Igreja, há dois tipos de homossexualidade – constitutiva/inata, ocasional/periférica. Uma faz parte da identidade do sujeito, constitutiva da personalidade, e condiciona o modo de ser e de agir de uma pessoa; ela a descobre, progressivamente, à medida que se desenvolve e amadurece afetiva e sexualmente, embora não saiba o porquê; neste caso, o que acaba dependendo da pessoa é se ela vai ou não realizar o próprio desejo, como e com quem.

Sentir ou não atração escapa da possibilidade de escolha; a outra, denominada momentânea, ocasional, periférica, transitória1, depende do contexto e da fase em que se encontra e facilmente é superável, isto é, não faz parte da personalidade, mas se expressa, sobretudo, por experiências sexuais com pessoas do sexo oposto ou do mesmo sexo. A orientação transitória depende da fase evolutiva em que a pessoa se encontra, da realidade concreta na qual ela vive, dos condicionamentos ou da pressão externa, da sua opção pessoal.

A orientação afetivo-sexual, assim como a sexualidade, é dimensão constitutiva da pessoa. Além de fazer parte da personalidade, ela condiciona o modo de ser e de existir de uma pessoa, e, por isso, pode ser definida como condição antropológica. Ela se define pelo fato de a “orientação” do objeto do próprio desejo ser predominantemente ou exclusiva por pessoas do sexo oposto ou do mesmo sexo2. Ninguém escolhe o objeto do próprio desejo, mas o descobre, progressivamente, à medida que se desenvolve e amadurece afetiva e sexualmente.

Homossexualidade e heterossexualidade

Apesar de estarmos em 2020, ninguém conseguiu descobrir, ainda, uma causa que explique por que determinadas pessoas são hétero e outras homossexuais. Segundo Vidal, “devemos reconhecer que não existe uma explicação apoditicamente satisfatória da homossexualidade humana: não se conhecem com clareza fatores biológicos (genéticos?, hormonais?, embrionária?) que a sustentam; não existe uma explicação psicológica científica (variação na relação paterno-filial?, resultado de uma variação na aprendizagem psicossocial?); na homossexualidade, trata-se, fundamentalmente, do sentido global de um ser humano. A homossexualidade não é só nem, principalmente, um fenômeno sexual, mas a condição antropológica de um ser pessoal; o homossexual é, antes de tudo, um ser humano com uma condição e um destino perfeitamente humanizável e humanizante”.3

Hoje, o que tanto as ciências quanto a Igreja ensinam é que, embora não se saibam as causas, ninguém escolhe ser hétero ou homossexual. A pessoa descobre, progressivamente, a sua atração, o objeto do seu desejo.

É uma doença?

Em 1973, a Associação Psiquiátrica Norte-Americana (APA) retirou a homossexualidade de sua lista de doenças, distúrbios psíquicos ou perversão. Em 1990, a Organização Mundial da Saúde retirou a homossexualidade da lista de doenças.

Muitas organizações de médicos e psicólogos declararam que a homossexualidade não é doença, distúrbio nem perversão. A Igreja assumiu esta perspectiva a ponto de, a partir da década de 1980, não considerar a homossexualidade como doença. Sobre as tentativas de explicação, afirma Mettler, em sua tese de doutorado (Frankfurt/Alemanha, maio de 2008): “nenhum dos estudos existentes, até agora, que tentaram comprovar fatores biológicos como causa principal da homossexualidade, pode ser apresentado como definitivo. Tais estudos são, na melhor das hipóteses, meramente especulativos. Além de não serem livres de contradições, seus resultados não foram repetidos nem confirmados até o presente por outras pesquisas independentes”.4

Enquanto não dispomos de dados que nos permitem apontar “a” causa da homossexualidade, talvez seja melhor falar de fatores que contribuem para a origem da orientação sexual – quer heterossexual quer homossexual –, fatores estes que estão profundamente enraizados em nossas primeiras experiências e que, sem dúvida, refletem a convergência de muitas circunstâncias biológicas, psicológicas e socioculturais.5

É de grande complexidade falar da gênese e as causas que possibilitam a homossexualidade. Portanto, podemos dizer que não existe uma explicação definitiva da homossexualidade humana. Falamos de uma conjugação de fatores, mesmo que um deles possa ser preponderante. E nesta conjugação de fatores, educação e meio ambiente têm peso preponderante.

Como cristãos, como devemos agir?

A pergunta sobre os fatores que incidem na orientação sexual de uma pessoa, para nós cristãos, não é o mais importante. O que importa, acima de tudo, é acolher tais pessoas homossexuais “com respeito, compaixão e delicadeza”, ajudá-las a “realizar a vontade de Deus em sua vida” e aproximá-la, “gradual e resolutamente, da perfeição cristã”, como afirma o Catecismo da Igreja Católica.6 O conhecimento dos possíveis fatores que incidem na orientação sexual das pessoas é importante na medida em que nos ajudam a compreendê-las melhor, conviver com elas, respeitá-las mais profundamente e ajudá-las a buscar a santidade de vida.7

Podemos dizer, contudo, que a homossexualidade não é uma opção, mas uma condição ou orientação que a pessoa descobre durante o processo de desenvolvimento e amadurecimento afetivo-sexual. É preciso deixar claro que ninguém escolhe a própria orientação sexual, isto é, ninguém decide ser homossexual ou heterossexual. O que entra no âmbito da decisão pessoal é o modo como a pessoa realiza ou satisfaz o seu desejo. Aí, sim, a responsabilidade é pessoal. A pessoa pode não ser responsável por ser hétero ou homossexual, mas ter um comportamento como tal, no limite de sua liberdade, é uma decisão da pessoa.

Foi de grande impacto uma entrevista em que o Papa Francisco disse: “Se uma pessoa é gay, busca Deus e tem boa vontade, quem sou eu para a julgar? (…) Não se deve marginalizar essas pessoas por isso”.8 Temos diante de nós um grande desafio: já que não podemos julgar – muito menos culpabilizar a pessoa por ser o que é –, cabe a nós a proposta de uma pastoral que se caracterize pelos passos que Francisco propõe na Amoris Laetitia: acompanhar, discernir e integrar.9 Mas, para que isso aconteça, é preciso, antes de tudo, acolher a pessoa como ela é, repudiando toda espécie de preconceito, discriminação e exclusão. Não podemos ignorar que a proposta evangélica é sempre inclusiva. Basta que prestemos atenção em Jesus, o Cristo.

Referências:

1 Cf. CONGREGAÇÃO PARA DOUTRINA DA FÉ. Persona Humana. Declaração sobre alguns pontos de ética sexual. Petrópolis: Vozes, 1976, n. 8.

2 Cf. CONGREGAÇÃO PARA DOUTRINA DA FÉ. Persona Humana. Declaração sobre alguns pontos de ética sexual. Petrópolis: Vozes, 1976, n. 8.

3 VIDAL, Marciano, Ética da sexualidade. São Paulo: Loyola, 2002, p. 119-120.

4 METTLER, Peter. Homossexualidade e ministério ordenado: Critérios de análise e correlações incômodas. In: Presbíteros. Um site de referência para o clero católico. Síntese da tese disponível em: https://www.presbiteros.org.br/homossexualidade-e-ministerio-ordenado/ Acesso em 20/02/2020

5 Cf. GENOVESI, Vincent J. Em busca do amor: moralidade católica e sexualidade humana. São Paulo: Loyola, 2008, p.257.

6 CATECISMO DA IGREJA CATÓLICA (Catechismus Catholicae Ecclesiae), 7ed., Petrópolis: Vozes, 1997, n. 2358-2359.

7 Cf. MOSER, A. O enigma da esfinge: A sexualidade. Petrópolis: Vozes, 2001, p.222.

8 Papa FRANCISCO. “Encontro do santo padre com os jornalistas durante voo de regresso a Roma”, 28 de julho de 2013.

9 Cf. Papa FRANCISCO. Exortação apostólica Amoris laetitia. A alegria do amor. São Paulo: Loyola, 2016, n. 293-312.

Padre Mário Marcelo, scj - Mestre em zootecnia pela Universidade Federal de Lavras (MG), padre Mário é também licenciado em Filosofia pela Fundação Educacional de Brusque (SC) e bacharel em Teologia pela PUC-RJ. Mestre em Teologia Prática pelo Centro Universitário Assunção (SP). Doutor em Teologia Moral pela Academia Alfonsiana de Roma/Itália. O sacerdote é autor e assessor na área de Bioética e Teologia Moral; além de professor da Faculdade Dehoniana em Taubaté (SP). Membro da Sociedade Brasileira de Teologia Moral e da Sociedade Brasileira de Bioética. Membro do grupo Interdisciplinar de Peritos (GIP) da Comissão Episcopal Pastoral para a Doutrina da Fé da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB). Autor de livros publicados pela Editora Canção Nova.

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