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Esse fato foi incorporado à realidade e é sobejamente conhecido.

Trata-se de tática extremamente estranha essa de denegar direito a quem o tem. Já se sabe o resultado; são frequentes os precedentes e, ainda assim, o benefício é negado.

Isso cria enorme tumulto e faz com que a Justiça Federal, que desempenha  papel fundamental na história do direito previdenciário, substitua a administração pública na concessão dos benefícios.

Muitas vezes o benefício é negado indevidamente e o caso adentra no Poder Judiciário.

O juiz, diante do fato concreto,  percebe que o segurado carece daquela prestação, revestida de natureza alimentar. Esse dado é essencial: o benefício previdenciário ou assistencial tem natureza alimentar. É inconcebível, portanto, que se cogite de devolução de valores eventualmente recebidos de maneira indevida, exceto em situações de fraude.

Como alguém devolveria o consumido no plano alimentar?  Debate estranhável esse, pois a maior parte daqueles que percebem benefícios vivem em extrema necessidade.

Sublinhe-se: o valor médio dos benefícios da Previdência Social é de cerca de um e meio salário-mínimo. E, outro dado: 85% dos benefícios correspondem ao valor de um salário-mínimo.

Ponhamo-nos no lugar de alguém que obtém liminar judicial e tem implantado o benefício. Pode cogitar que está tudo bem. E,  logo depois, recebe a ordem: “Não é seu esse direito. Devolva!”

O pior é que a denegação do benefício, muitas vezes, resulta do despreparo administrativo da Previdência Social, que não concede o que é devido e inúmeras vezes concede o que não é devido. É um paradoxo, mas é verdade.

Aí vem a questão da boa-fé. O segurado que pleiteia em juízo tem boa-fé.

Existem fraudes, evidentemente, mas esse é outro tópico. Fraude é problema criminal, não questão de seguridade social.

O segurado que vai à Justiça está em boa-fé, amparado na inafastabilidade do controle jurisdicional.

O valor recebido é revestido, como todos sabem, de natureza alimentar.

Ademais, o dinheiro da seguridade social pertence à comunidade protegida. Às vezes os dirigentes do INSS parecem supor que o dinheiro é deles ou que se trata de recursos pertencentes ao Estado ou ao governo. Não e não!

É, pois, necessário e urgente que sejam revistas as práticas administrativas que, movidas por comandos ocultos, denegam as prestações com a estranha missão protelatória de deixar as despesas para depois.

O pior de tudo isso é que ao denegar prestações devidas, a Previdência Social sofre enormes prejuízos. E, ao cobrar devolução, cria problema quase insolúvel para a subsistência – com dignidade – do beneficiário.

Só para que se tenha bem presente.

A devolução, de acordo com inexplicável praxe, deve representar um desconto de 30% (trinta por cento) do valor da já exígua prestação.

E, o que torna o cenário ainda mais grave e até dramático.

Pode ser que aquela pessoa, premida por necessidades urgentes, tenha caído no atrativo perigosíssimo do empréstimo consignado. Esse empréstimo comprometerá até 35% (trinta e cinco por cento) da renda do beneficiário.

Somemos dois mais dois: 30 + 35. Restará, para a subsistência do beneficiário e, eventualmente, daqueles que vivem às suas expensas, a ínfima quantia de trinta e cinco por cento do valor mensal do benefício.

E o mínimo existencial?

O artigo 6º da Constituição de 1988 define esse mínimo ao exigir  alimentação, habitação, vestuário, transporte etc.

Com trinta e cinco por cento de mil e cem reais – atual salário-mínimo –  alguém conseguirá custear esses itens?

O objetivo da Ordem Social Constitucional é a Justiça Social que alberga, a um só tempo, a seguridade social (art. 193 da CF) e a promoção do bem de todos.

Mais atenção e cuidado, sobretudo por parte das autoridades administrativas, para que não haja demora na concessão de benefícios; para que sejam concedidas de pronto as prestações devidas e para que se repense, com urgência, na torpe fórmula de devolução.

Wagner Balera é professor Titular de Direitos Humanos na Faculdade de Direito da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo — PUC-SP. É Livre-Docente em Direitos Humanos, Doutor em Direito das Relações Sociais.  Autor de mais de 20 livros da área de Direitos Humanos. Professor Titular de Direito Previdenciário da PUC-SP é sócio  do escritório Balera, Berbel & Mitne Advogados.

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