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Perplexa deambula a maioria dos homens. No interior de seus lares, amáveis casulos, por mais pobres que sejam, em quarentena; inconsequentes, revoltados, talvez a pretender aproveitar os últimos dias, os que se fingem de valentes nos aglomerados desaconselhados.

O covid, em todo seu potencial de devastação, já habitava essa terra quando nossa avó arcana, não se sabe como, deu à luz de sua graça nessas nossas plagas. Por óbvio, sem o grau de letalidade hoje demonstrado; em tal hipótese, a humanidade seria uma iniciativa natimorto. Consequentemente, a única conclusão possível é de que nossa convivência, por tantos milênios, tornou-nos - homens e vírus - crescentemente assassinos.

Há cinquenta milênios, ao nos tornarmos conscientes, principalmente de que somos mortais - fundamental diferença que nos distancia sentimentalmente dos irracionais - pudemos cogitar do sentido de nossas vidas; é a interrogação básica no atual torvelinho.

Claramente só quem acredita na terra plana pode supor - e é provável que o faça - que o Covid se nos assemelhe em matéria de reflexão. Se assim fosse, estaríamos enfrentando um inimigo dotado da arma mais destruidora - a inteligência. O organismo invisível que sucateia nossa saúde, vida e escancara desvalores, evoluiu, sobretudo no compasso de sua convivência conosco, mas não chegou lá. Nessa hipótese, não poderíamos cogitar de medicamentos e vacinas que os liquidarão. Porém, suas garras recrudesceram.

A constatação darwinista não comporta exceções. Todos os seres vivos, visíveis ou invisíveis, macros ou micros, evoluem sob o impacto das circunstâncias exteriores. E haverá causa mais impactante da evolução virótica do que nossas recorrentes guerras, jorros de sangue que impregnaram o solo, enriquecimento do urânio, fabricação da bomba atômica e o exemplo que deram ao vírus em Hiroshima, Nagasaki e Chernobyl?  Espectador sorridente e silencioso, ele foi estimulado ao crescimento - para o mal - pois essa foi a tendência da natureza do ser dominante do planeta. Lentamente, atingiu o ponto atual, nada distinto de nossa caminhada no sentido da destruição de vidas semelhantes ou de estágios civilizatórios inferiores.

Não inteligentes, mas de propensão habilidosa, no mundo secreto de cepas de exércitos astutos. Assim, silenciosos, sentiram-se confortáveis ao se hospedarem em organismos maiores, bem mais desatinados do que os inconscientes da morte e que simplesmente se dedicam à sobrevivência momentânea. Internamente se acomodariam como uma bastilha nos meandros do "homo sapiens", que os convidaram por suas portas abertas dos orifícios de entrada - bocas, narizes e olhos.

Solertemente nos torpedearam, com o fizeram muitos grupos guerreiros humanos contra seus irmãos. Por todos os francos. Instintivamente cuidaram de sua multiplicação geográfica. Caso contrário, seriam eles os dizimados. De sua percepção de nossa dependência fundamental do hidrogênio e do oxigênio, atacam nossas caixas de ressonância desses elementos vitais, os pulmões, assoreando as vias aquáticas que os conduzem na intimidade, as veias condutoras do sangue.

No fundo é a velha luta por espaço, inscientes os protagonistas, nesta fase ainda crua da expansão universal, da amplitude do cosmos, que dispensa tais conflitos, não só por sua imensidão, mas ainda por seu movimento incessante na direção da infinitude.

Não deveríamos, pois, estar abatidos pela surpresa. Trata-se de um acontecimento impulsionado pelas deficiências e colisões próprias do encontro entre matéria, energia e movimento. Se o impacto terrível e surpreendente entre os corpos pudesse ter sido evitado, isso caberia ao ramo dessas conjunções mais avançado pelo atributo de consciência racional - simplesmente nós.

Amadeu Garrido de Paula, poeta e ensaista literário, é advogado, atuando há mais de 40 anos em defesa de causas relacionadas à Justiça do Trabalho e ao Direito Constitucional, Empresarial e Sindical. Fundador do Escritório Garrido de Paula Advocacia e autor dos livros: “Universo Invisível” e “Poesia & Prosa sob a Tempestade”. Ambos à venda na Livraria Cultura (Bruna Lyra Raicoski   bruna@deleon.com.br)

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