Crônica: Branca de Neve dos dentes amarelos
- Espelho, espelho meu, existe alguém mais bela do que eu?
- Olha dona madrasta, o problema aqui é que a senhora já está com uma certa idade. Apareceram umas ruguinhas aqui, uma gordurinha localizada ali. Por isso hoje a Branca de Neve é a mais bela de todas, já que está na flor da idade, no frescor da juventude...
A madrasta má enfurecida solta um palavrão e planeja um modo de exterminar Branca de Neve para acabar com a concorrência, depois se matricularia numa academia e faria algumas aplicações de Botox.
Branca de Neve estava lavando roupas num tanquinho atrás da casa dos sete anões. Enquanto esfregava as cuequinhas minúsculas, a Madrasta má disfarçada de velhinha caquética se aproxima pedindo um copo d’água. A mocinha gentil e bondosa sacia a sede da horrível velha que falsamente agradece oferecendo uma maça envenenada.
- Tome menina, uma maçã de presente por ser tão meiga comigo.
- Muito obrigada senhora, mas eu não posso aceitar.
- Por que criança? É uma maçã tão suculenta, tão vermelhinha. Prove, você vai ver como é docinha.
- Eu não posso comer maçã porque me dá gases. Dá última vez que comi antes de dormir, os coitados dos anões não aguentaram ficar dentro de casa e tiveram que dormir na floresta. O pior é que estava chovendo!
- Não me diga. Mas que fruta você come?
- Sou meio enjoadinha com frutas. Só gosto de uvaia e jatobá.
A madrasta má disfarçada de velhinha vai embora irada com o fracasso de sua investida, porém, não desistiria.
No outro dia ela retornou até a casa de Branca de Neve, dessa vez com um jatobá envenenado.
- Menina, que coincidência, eu vinha passando pela estrada e encontrei um pé de jatobá, me lembrei de você. Olhe que delícia.
Branca de Neve arregalou os olhos e lambeu os beiços. A jovem se deliciou e se empanturrou de jatobá. Alguns minutos depois caiu durinha.
A madrasta má foi embora saltitante por ser agora a mais bela de todas.
Quando os anões chegaram e encontraram Branca de Neve morta, a colocaram sobre um balcão para vela-la. À noite um belo e valente príncipe apareceu por lá e se apaixonou pela defunta. Sabia que um beijo quebraria o feitiço e viveriam felizes para sempre.
Entretanto, ao aproximar o rosto dos lábios da moça, o príncipe observou aqueles dentes amarelos e empastados de jatobá. Parou, ficou com nojinho e foi embora.
Para nunca mais voltar.
Rodrigo Alves de Carvalho nasceu em Jacutinga (MG). Jornalista, escritor e poeta possui diversos prêmios literários em vários estados e participação em importantes coletâneas de poesia, contos e crônicas. Em 2018 lançou seu primeiro livro individual intitulado “Contos Colhidos” pela editora Clube de Autores - rodrigojacutinga@hotmail.com
#JornalUniãoLeia também: