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Cultura 06/12/2019  08h15

Londrina pelo avesso

Sonia Pascolati lança “Bodas de Café”, dramaturgia emblemática de Nitis Jacon em colaboração com o Grupo Proteu que conta a história de Londrina pelo viés de pioneiros ignorados pela história oficial

Um presente pelos 85 anos de Londrina e pelos 40 anos do Proteu. A edição de “Bodas de Café” que a pesquisadora e professora do Departamento de Letras Vernáculas da UEL Sonia Pascolati lança neste sábado não é apenas a publicação de uma das peças mais importantes da dramaturgia londrinense. Trata-se de estudo profundo sobre as histórias esquecidas da cidade em influxo com seu DNA cultural. O livro traz a íntegra do texto assinado por Nitis Jacon a partir de trabalho coletivo com o Proteu, além de dois ensaios críticos assinados por Pascolati em que analisa a obra por seu viés político ou dialético e a trajetória do grupo que projetou o nome de Londrina para além-fronteiras da década de 1970 a 1990.

O evento de lançamento acontece a partir das 18h30 do sábado, dia 7, no Sesc Cadeião Cultural (R. Sergipe, 52), com entrada gratuita. Sonia fará uma exposição dos principais conteúdos da peça e contará com a leitura de trechos pelos atores Raíssa Bessa, Raquel Sant’Anna e Wilson Papeschi, que participaram de uma remontagem de 2014 realizada pela Funcart e dirigida por Carol Ribeiro e Simone Andrade. Na ocasião, o livro estará sendo vendido pelo preço promocional de R$25 (com 50% de desconto sobre o preço de capa). A edição é da Eduel e o apoio para o evento é do Sesc. Um primeiro lançamento foi realizado no mês de agosto, dentro da programação do Filo.

 “Bodas de Café” traz ainda fartas notas de rodapé que auxiliam na compreensão das alegorias da dramaturgia, além de explicar dados de encenação, que Sonia obteve a partir de um vídeo da montagem original, de 1984, e de entrevistas com 12 integrantes do Proteu. Primeiro texto produzido coletivamente pelo grupo, “Bodas de Café” é considerado um marco na trajetória do teatro londrinense pela grande repercussão da peça, qualidade e versatilidade cênica.

O livro é resultado de pós-doutorado de Sonia Pascolati no Programa de Pós-Graduação em Literatura e Interculturalidade da Universidade Estadual da Paraíba (UEPB – 2018). Para realizar a pesquisa, ela fez um levantamento de documentos relacionados ao espetáculo, como ficha técnica, historiografia, material manuscrito, além do datiloscrito original. A montagem de “Bodas de Café”, que reuniu um elenco de 29 atores, levou para os palcos a história de Londrina a partir da perspectiva dos cidadãos comuns, como o trabalhador rural, o corretor de imóveis e a prostituta.

Na época, o espetáculo marcou as comemorações do aniversário de 50 anos da cidade, sendo apresentado ao público em dezembro de 1984, no Teatro Ouro Verde. A estreia ocorreu meses antes, em julho, na Casa de Cultura da UEL. Logo após, o grupo seguiu para o Rio de Janeiro, onde participou do projeto Mambembão. O espetáculo foi apresentado 88 vezes, entre 1983 e 1984.

Confira entrevista com Sonia Pascolati:

Como e quando foi o seu primeiro contato com a dramaturgia de Nitis Jacon e do Proteu?

Desenvolvi um projeto de pesquisa sobre dramaturgia londrinense de 2013 a 2016 na UEL. Em 2014, nos dedicamos ao estudo dos nove textos de autoria coletiva do grupo Proteu.

Na elaboração do livro, você realiza um longo trabalho de pesquisa documental e entrevistas. Quais as descobertas mais surpreendentes?

A avalanche de recepções positivas aos espetáculos, registrada pela imprensa, com destaque para Bodas..., Salto alto, ZYDrina e Transgreunte Ascendente Aquarius; a compreensão do processo criativo do grupo; e, pessoalmente, conhecer outras facetas da história de Londrina.

Qual foi o estado em que encontrou os originais de Bodas de café e quais os principais desafios na transcrição da dramaturgia para o formato de livro?

À época, o material estava na Divisão de Artes Cênicas da Casa de Cultura da UEL, sob os cuidados de Paulinho Braz, que nos deu livre acesso a tudo. Para o livro, meu esforço foi a inserção de notas explicativas de teor histórico e dramatúrgico, assim como o cotejamento com uma gravação em vídeo do espetáculo encenado em 1984.

A narração da história não-oficial ou por vozes heterodoxas é um procedimento que ganha força no teatro contemporâneo. Você considera que Nitis e o Proteu antecipam características na forma e no conteúdo da cena atual? Quais são estas características?

Creio que essa revisão crítica da história oficial venha ocupando os palcos nacionais desde a primeira metade do século XX, a exemplo de Oswald de Andrade e Jorge Andrade. Minha análise crítica do texto-espetáculo localiza essa produção na intersecção entre o moderno e o contemporâneo no teatro, uma vez que a presença brechtiana é flagrante, mas o espetáculo é pleno de performatividade.

 “Londrina é uma adolescente ingênua travestida de mulher fatal”. É a frase do texto que você elege para epígrafe. Bodas de café ajuda a compreender a Londrina do presente? O que há de sedutor e de pueril na Pequena Londres?

A mulher fatal se revela em tudo em que Londrina é ponta de lança: seu arrojo econômico e industrial, sua potência cultural e artística, mas essa imagem camufla a adolescente ingênua que permanece apegada a valores morais tradicionais.

Tanta gente namora e admira Nitis, com reverência e distância respeitosa. Ela é uma força presente, futura. Você chegou a encontrá-la? Se sim, como foi? Se não, o que diria à dama do teatro londrinense?

Não tive o prazer de abraçar Nitis, mas estive em sua presença pela leitura de “Memória e recordação” (livro de autoria de Nitis Jacon publicado em 2010, na ocasião dos 40 anos do Filo), obra fundamental para a pesquisa, e construí uma imagem sua por meio dos dizeres dos atores que entrevistei. O que dizer a Nitis? Ela é um monumento. Que as gerações artísticas presentes e futuras saibam honrar seu legado, imprescindível, pedra fundamental de nossa cultura.

Renato Forin Jr./Asimp

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