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A partir desta quinta-feira, 5 de abril, a escuta de crianças e adolescentes vítimas ou testemunhas de violência e de abuso sexual deverá seguir metodologia humanizada de entrevista. Trata-se da oitiva por meio do depoimento especial ou da escuta qualificada, que se tornou obrigatória com a Lei nº 13.431, sancionada em 2017 e que passa a vigorar nesta semana em todo o país.

Para se preparar para a implantação das mudanças, o Ministério Público do Paraná tem realizado uma série de reuniões com integrantes do sistema de Justiça e da rede de proteção à criança e ao adolescente. O processo de adaptação conta com a participação de órgãos da área da saúde, assistência social, segurança pública, além da Defensoria Pública, Ordem dos Advogados do Brasil, Tribunal de Justiça e Conselho Estadual dos Direitos da Criança e do Adolescente. Durante os encontros, são formuladas orientações sobre como devem se articular para a adoção da lei, repassadas a todos os envolvidos no processo.

De acordo com a promotora de Justiça Luciana Linero, que atua no Centro de Apoio Operacional das Promotorias de Justiça da Criança e do Adolescente, a preocupação tanto do Ministério Público como dos demais órgãos do sistema de Justiça infantojuvenil não é recente e vem sendo discutida há muito tempo. “Antes do advento da Lei nº 13.431, Ministério Público, Poder Judiciário, Defensoria Pública e Secretaria de Estado de Segurança Pública firmaram um termo de cooperação para garantir a aplicação das técnicas da escuta qualificada e do depoimento especial, depois corroboradas pela nova legislação”, destaca.

Método humanizado

Com a aplicação da técnica, o objetivo é evitar que crianças e adolescentes tenham que reviver fatos traumáticos ao depor e contribuir para a fidedignidade das informações. O promotor de Justiça David Kerber de Aguiar, que atua na Promotoria de Justiça com atribuição na área da Criança e do Adolescente da comarca de Araucária, explica que, na escuta humanizada, a oitiva deve ocorrer com a maior brevidade possível e de uma única vez, em um ambiente reservado e adequado ao universo infantojuvenil. O depoimento deve ser tomado por profissionais como psicólogos e assistentes sociais, capacitados para conversar com as crianças, na tentativa de extrair a verdade dos fatos, procurando ganhar confiança e não interromper os relatos. Além disso, no curso do processo judicial, a conversa entre a vítima e o técnico é gravada e transmitida em tempo real para a sala de audiência, onde ficam juiz, promotores e advogados de defesa, sendo preservado o sigilo. O profissional especializado poderá adaptar as perguntas à linguagem de melhor compreensão da criança ou do adolescente.

“Em regra, antes do advento da lei, meninos e meninas eram ouvidos em regular audiência criminal, quase sempre anos depois dos fatos, e tinham que prestar depoimentos várias vezes a diferentes órgãos, como polícia, Conselho Tutelar, Ministério Público, além da audiência na Vara Criminal”, conta o promotor. “A nova metodologia pretende justamente evitar que a criança reviva fatos traumáticos, pois passará a contar a história apenas uma vez e a um único profissional treinado para a acolher”, ressalta. Outro exemplo do que ocorria antes da lei eram as perguntas impertinentes, que, mesmo sendo indeferidas em seguida, já haviam exposto o depoente a seus efeitos. Destaca-se também que, na audiência tradicional, crianças e adolescentes ficavam com frequência na presença de seu agressor, o que causava medo e constrangimento.

Prova antecipada

A implementação da lei representou a normatização de práticas de proteção que já vinham sendo adotadas há algum tempo em muitos órgãos de Justiça com valor de prova testemunhal e pericial. Essa é outra vantagem da oitiva humanizada, em que o testemunho da criança ou do adolescente para fins de prova judicial, que aconteceria só no fim do processo, é antecipado. Conforme afirma David Aguiar, “essa modalidade gera a indispensável prova para o esclarecimento dos fatos, quer para autorizar a apuração e eventual condenação penal, quer para, se for o caso, dirimir suspeitas e absolver indiciados, evitando-se eventuais desgastes trazidos com o passar do tempo”.

O promotor de Justiça complementa que o maior benefício trazido pela Lei nº 13.431 é o tratamento de crianças e adolescentes vítimas ou testemunhas de crimes como sujeitos de direito e não como objetos de prova, uma vez que não estarão mais a mercê das incessantes oitivas quanto aos mesmos fatos traumáticos. Ele também acrescenta que a legislação faculta a realização do depoimento especial para vítimas e testemunhas de violência com idade entre 18 e 21 anos, em situações que justifiquem a excepcionalidade.

Ministério Público

A Lei nº 13.431/2017 representa um importante avanço na atividade-fim do Ministério Público, no âmbito do processo criminal. Normatiza importante meio de prova que garante a apuração da verdade de forma célere, respeitando a condição peculiar de desenvolvimento físico, psíquico e moral de crianças e adolescentes e sua proteção integral. Com o advento da lei, não há mais entraves normativos para as Promotorias de Justiça com atribuição criminal requererem o depoimento especial.

Nesse movimento, segundo David Aguiar, “é fundamental que os promotores de Justiça realizem articulação com os demais atores de atendimento do público infantojuvenil, visando a efetiva implementação da oitiva especial em suas modalidades. Devem também fomentar que Municípios e Estado desenvolvam políticas integradas e coordenadas que visem a garantir os direitos de crianças e adolescentes e resguardá-los de todo tipo de violência”.
 

Formas de violência

A lei elenca as formas de violência contra as quais as crianças e os adolescentes devem ser protegidos. Resumidamente, são:

– Física: ofensa à integridade ou saúde corporal ou que cause sofrimento;

– Psicológica: ameaça, agressão verbal, bullying e alienação parental;

– Sexual: conjunção carnal ou outro ato libidinoso, abuso sexual, exploração sexual e tráfico de pessoas;

– Institucional: praticada por instituição pública ou privada, inclusive quando gerar revitimização.

Direitos e garantias

Na condição de fiscal da lei, o Ministério Público aponta que a nova legislação destacou os seguintes direitos e garantias de crianças e adolescentes:

– Ser prioridade absoluta e ter considerada a condição peculiar de pessoa em desenvolvimento;

– Ter a intimidade e as condições pessoais protegidas;

– Receber informação adequada à sua etapa de desenvolvimento acerca de seus direitos;

– Prestar declarações em formato adaptado (aplica-se à pessoa com deficiência ou que não fale português);

– Contar com assistência jurídica e psicossocial;

– Ter a garantia da confidencialidade das declarações prestadas, salvo para fins de assistência à saúde e de persecução penal;

– Contar com prioridade na tramitação do processo, celeridade processual, idoneidade do atendimento e limitação das intervenções;

– Poder expressar seus desejos e opiniões, assim como permanecer em silêncio.
Ascom/Ministério Público do Paraná

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